4 de abril de 2011

Análise da Invocação

Invocar significa apelar, pedir, suplicar.
Nestas duas estrofes o poeta evidencia a importância do assunto a tratar e assim pede auxílio às ninfas do Tejo para o ajudarem nesta tarefa tão grandiosa (‘’ Dai-me agora um som alto e sublimado, / Um estilo grandíloco e corrente’’) (canto I est. 4 versos 4 e 5).
Camões, sendo um poeta cristão, não acreditava nestas entidades pagãs. No entanto utiliza-as como um simples recurso poético. Este usa a sua invocação como uma maneira de engrandecer o herói. Este precisa agora de ‘’ um som alto e sublimado’’. Camões chega mesmo a ‘’confessar’’ que nem o apelo das Tágides irá ser suficiente para transpor em verso, com a devida dignidade, os feitos dos portugueses (" Que se espalhe e se cante no Universo, / Se tão sublime preço cabe em verso.") (canto I est. 4 versos 7 e 8).
Podemos também observar o carácter patriótico de Luís de Camões, pois este não irá suplicar às ninfas greco-latinas mas às ninfas do Tejo, as Tágides. Através da análise do verso ‘’Tágides minhas’’ (Canto I, est. 4, verso 1), é sugerida uma relação afectiva entre o poeta e as ninfas, particularmente pelo uso do determinante possessivo.
Tratando-se de um pedido, a Invocação assume a forma de discurso persuasivo, onde predomina a função apelativa da linguagem e as marcas características desse tipo de discurso: o vocativo e os verbos no modo imperativo.
E vós, Tágides minhas, (...)
Dai-me (...)
Dai-me (...)
Dai-me (...)
Estão presentes também, de modo a persuadir mais facilmente o leitor, argumentos como por exemplo: ‘‘ pois criado / Tendes em mi um novo engenho ardente’’ (canto I, est. 4, versos 1 e 2), ou seja, uma vez que as ninfas concederam ao poeta uma nova inspiração, então devem também conceder-lhe o estilo e a eloquência necessários para narrar a história. O segundo argumento faz-se através da comparação das ninfas to Tejo com a fonte de Hipocrene insinuando que estas ninfas tinham igual ou superior poder às das águas da mesma ("Por que de vossas águas Febo ordene / Que não tenham enveja às de Hipocrene." (canto I, est.4, versos 7 e 8)). O terceiro argumento encerra o pedido: "Que se espalhe e se cante no Universo" (canto I, est.5, verso 7). Para que os feitos dos portugueses possam ser admirados no mundo inteiro, é necessário que as ninfas atendam o seu pedido. Neste caso, recorre a uma argumentação finalística: pressupõe-se que esses feitos são dignos de serem apreciados, mas para o serem é necessário um estilo extremamente elevado. Aliás, o último verso sugere a ideia de que os feitos dos portugueses são tão grandiosos que dificilmente poderão ser traduzidos em verso de forma adequada. Como se vê, a estratégia de engrandecimento do povo português, iniciada na Proposição, é retomada aqui, quase nos mesmos termos. Comparem-se estes dois últimos versos com aqueles com que encerra a primeira parte da invocação.

Cantando, espalharei por toda a parte,
Se a tanto me ajudar o engenho e arte.

Que se espalhe e se cante no Universo,
Se tão sublime preço cabe em verso.

Até os instrumentos musicais associados a cada um dos tipos de poesia (lírica e épica) são significativos: à simplicidade da flauta, que associa à lírica, contrapõe a sonoridade guerreira da tuba, própria da epopeia.
E ao referir-se à " tuba canora e belicosa ", acrescenta: " que o peito acende e a cor ao gesto muda ". Com esse verso pretende transmitir a ideia de que o estilo épico exerce sobre o leitor um intenso efeito emotivo, semelhante à exaltação sentida pelos próprios heróis que vai cantar. Note-se o recurso à metáfora "o peito acende", que sugere uma espécie de fogo interior avassalador, reforçada pela inversão (colocação do complemento directo antes do verbo).

Para além das ninfas do Tejo, ao longo da epopeia, Camões irá invocar inspiração divina à musa Calíope, musa grega da poesia épica, da ciência e da eloquência, e de novo às ninfas do Tejo e do Mondego. Estes apelos têm lugar no canto III, estrofes 1 e 2, com objectivo de dar ao poeta inspiração para narrar correcta e eloquentemente os factos a História de Portugal, no canto X estrofes 8 e 9, quando Camões, após anos a escrever a sua epopeia, sente, finalmente, o engelho concedido pelas musas a desvanecer (‘’os desgostos me vão levando ao rio/ Do negro esquecimento e eterno sono. ‘‘ (canto X, est. 9 versos 5 e 6)) e no canto VII estrofes 78-87, nestas estrofes, Camões invoca novamente as ninfas do Tejo e agora também as do Mondego queixando-se dos seus infortúnios.

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